Remadores Brasileiros Cruzam Litoral Histórico em Homenagem a Hans Staden, Aventureiro Alemão que Escapou de Canibais no Brasil

Expedição Hans Staden 500: Remo, História e Superação no Litoral Brasileiro

Uma jornada épica de 250 quilômetros, realizada entre os dias 14 e 16 de novembro, reuniu doze remadores do Clube de Regatas Bandeirante para reviver a rota de captura do aventureiro alemão Hans Staden. A expedição, que partiu de Bertioga e terminou em Paraty, foi idealizada para celebrar os 500 anos de nascimento de Staden, autor de um relato célebre sobre sua vivência com os tupinambás no Brasil.

Hans Staden, capturado em 1554 enquanto trabalhava como artilheiro em um forte na ilha de Santo Amaro, descreveu em seu livro as dramáticas nove meses de cativeiro, onde o plano era que ele se tornasse alimento para seus captores. A obra, “História Verdadeira e Descrição de uma Terra de Selvagens, Nus e Cruéis Comedores de Homens”, tornou-se um clássico, detalhando costumes indígenas e sua própria luta pela sobrevivência. A expedição de remo, patrocinada pela Autoridade Portuária de Santos com apoio do Ministério dos Portos e Aeroportos e do Governo Federal, buscou não apenas homenagear o aventureiro, mas também registrar um feito esportivo inédito na região.

O percurso, dividido em três dias, levou os atletas por paisagens deslumbrantes do litoral de São Paulo e Rio de Janeiro, contrastando a beleza natural atual com a terra que Hans Staden conheceu há quase cinco séculos. A expedição, além de seu caráter histórico, representou um desafio físico e mental para a equipe, que utilizou dois barcos “doubles coastal”, adaptados para travessias oceânicas, estabelecendo um recorde de distância e equipamento para a modalidade na área.

O Desafio da Rota de Hans Staden

A expedição começou em Bertioga, com os remadores partindo ao amanhecer em direção à ilha de Santo Amaro. O primeiro dia de remada os levou até a praia de Itaquanduba, em Ilhabela, onde foram recebidos com hospitalidade. A jornada seguiu na manhã seguinte rumo a Picinguaba, em Ubatuba, um dos trechos mais cênicos da costa.

O terceiro e último dia apresentou o maior desafio. A equipe partiu de Picinguaba e cruzou os limites entre São Paulo e Rio de Janeiro, finalizando a travessia em Paraty, cidade onde Hans Staden relatou ter presenciado um ritual de canibalismo. A jornada exigiu preparo físico intenso, com atletas completando mais de 30 quilômetros em 24 horas, enfrentando bolhas nas mãos e enjoos.

Avanço Esportivo e Histórico

O time de doze remadores era composto por quatro veteranos do Bandeirante, sete jovens do time universitário do clube (alunos da Poli-USP) e um atleta convidado. A preparação para a expedição começou no início do ano, sob a supervisão do treinador Acácio Roberto Lemos. O fotógrafo e cinegrafista Pisco del Gaiso acompanhou a jornada, registrando material para um minidocumentário com lançamento previsto para dezembro.

A modalidade “coastal”, usada na expedição, é relativamente nova no Brasil, mas com crescimento rápido. As provas dessa modalidade farão parte dos Jogos Olímpicos de Los Angeles em 2028, demonstrando a evolução do esporte. A travessia de 250 km em “doubles coastal” é considerada um recorde esportivo, pois não há registro de uma jornada similar com os mesmos equipamentos naquela região.

Enfrentando as Adversidades Naturais

As paradas ao longo do percurso incluíram cidades como São Sebastião e Caraguatatuba. A paisagem, embora bela, difere muito da terra que Staden conheceu, com a Mata Atlântica preservada em contraste com a ausência dos povos originários. Os remadores passaram mais de trinta horas na água, em revezamento constante, com trocas realizadas no mar, adicionando um elemento de emoção e exaustão.

O terceiro dia foi marcado por ondas curtas e sucessivas que exigiram esforço extra para furar a barreira. A chegada à Ponta de Joatinga, em Paraty, foi o ponto mais desafiador, conhecida por fortes ventos e ondas que podem superar 2 metros. Mesmo com ondulações de 1 metro, os remadores precisaram de atenção redobrada e esforço físico para manter a direção nos barcos de 7,5 metros de comprimento, o que reduziu a velocidade para 6 km/h.

A Perspectiva Histórica e o Legado de Staden

A expedição, que teve sua viagem adiada desde julho para garantir condições seguras, demonstra a habilidade dos indígenas, que navegavam sem recursos modernos. “A travessia feita com os barcos modernos, apropriados ao mar, mostra o quanto os indígenas eram habilidosos para remar grandes distâncias”, comentou Charles Medeiros, ex-vereador de Ubatuba. Staden registrou em seu livro pontos do litoral sudeste que coincidem com a rota dos remadores, como possíveis paradas em São Sebastião.

A história de Hans Staden ganhou popularidade no Brasil com a adaptação de Monteiro Lobato em 1927, “Aventuras de Hans Staden”. Pesquisadores como Vanete Santana-Dezmann e o escritor alemão Detlef Günter Thiel continuam a perpetuar seu legado. Em Ubatuba, a rua Hans Staden e ações culturais buscam estreitar laços entre Brasil e Alemanha, lembrando a saga do aventureiro que, após sua libertação, retornou à Europa.

Os remadores do Bandeirante voltaram para São Paulo impactados pela experiência. “O Litoral Norte de São Paulo e o litoral do Rio de Janeiro são lindos por si só. Agora, conhecê-los por uma perspectiva completamente diferente é algo que apenas o remo pode nos proporcionar”, afirmou Victor “Manaus” Tavares. A combinação de esporte, história e superação marcou a expedição, descrita como “uma viagem no tempo” por Rogerio Barbosa, tornando a jornada inesquecível para todos os envolvidos.

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